segunda-feira, 8 de junho de 2015

Capítulo 4: Horizontina - Parte 4-

Horizontina, onze de abril de 2048.

Fernando acordara antes de Paloma e resolveu comer alguma coisa antes de seguir para a prefeitura. As costelas ainda doíam, mas agora a dor havia se tornando suportável.

Como de costume vestiu-se preparado para mais um dia burocrático na prefeitura. Pedidos para pegar uma arma no arsenal, um cavalo para realizar uma viagem ou aumento da ração alimentar, eram os pedidos mais comuns. Embora ninguém passasse fome era costume do prefeito controlar a maior parte dos bens alimentícios produzidos.

Antes de sair de casa pegou sua boina preta e um sobretudo preto. Um dia e tanto o esperava.
Os portões haviam acabado de serem abertos. Pessoas saiam para mais um dia de trabalho nos campos próximos. Fernando conhecia praticamente todas as pessoas que moravam em Horizontina.  Algumas pessoas o cumprimentaram enquanto seguiam o seu rumo. A prefeitura estava a poucos metros.


Parou um pouco antes chegar à prefeitura e olhou em todas as regiões. O sol timidamente aparecia entre as brechas das nuvens. Sons de latidos, conversas chegavam a abafar o som do vento que estava surpreendentemente fraco hoje. De longe avistava duas pessoas terminando de ajustar as três turbinas eólicas. Se tudo desse certo, essas três turbinas juntamente com mais alguns painéis solares instalados pela cidade, conseguiriam gerar energia para todos.

Foto antiga da Prefeitura Municipal de Horizontina
                                       Foto antiga da Prefeitura Municipal de Horizontina


A prefeitura era uma das construções mais preservadas da cidade. Era uma grande estrutura de dois andares, com diversas salas, onde as decisões da cidade eram tomadas. Na frente da entrada principal da prefeitura, algumas pessoas esperavam para serem atendidas.

Entrando pela porta principal, percebeu um clima diferente do normal. A agitação dentro da prefeitura era incomum. As pessoas que trabalhavam na administração da cidade estavam andando de um lado para outro, alguns não escondiam um semblante de felicidade.

-Fernando!- 

Disse alegremente uma voz atrás dele. Era sua irmã. Beatriz tinha indo visitar seu irmão nos dias que ele ficou de repouso, comunicando tudo o que tinha acontecido de diferente na cidade. Mas esse movimento, essa felicidade não era comum. Algo tinha acontecido.

-O que está acontecendo aqui?- Perguntou Fernando.

-Simplesmente tudo! Não vou te contar nada agora, o prefeito quer ter ver. -

Fernando simplesmente respirou fundo intrigado com tantas coisas acontecendo em pouco. Essagitão toda, essa felicidade não era comum nesses tempos.
Enquanto Fernando subia penosamente os degraus da escada, parou no meio do caminho e olhou novamente para baixo. Beatriz continuava olhando para ele, com um grande sorriso. Embora ela estando vestida com seu uniforme, seu rosto esboçava em certo ponto uma alegria juvenil, algo que não via há tempos.

O penúltimo degrau da escada rangeu. Embora a prefeitura parece-se sólida por fora, sua estrutura dentro necessitava de muitas reformas. Subindo a escadaria e parou novamente para respirar. Suas costelas martelavam conforme ele respirava, tirando a boina para passar a mão pela testa para limpar o suor, visualizou mais agitação no segundo andar. Numa sala entreaberta Fernando visualizou Carlos mexendo no radio. Não era uma manutenção de rotina. Ele conseguira contanto com alguém. A sala era um mar fios, microfones e aparelhos de rádios conectados em varias estações de banda e frequência. Tudo parecia lentamente se encaixar, mas a pergunta que ficara era: Com quem?

-Com quem teriam tido contato? Alguma base militar? O Governo?-. Eram tantas perguntas que vinham ao mesmo, que qualquer cogitação era válida. 

Carlos estava com um fone de ouvido e em suas mãos um caderno onde fazia anotações, provavelmente informações repassadas por quem estava do outro lado. Fernando ficou intrigado e entusiasmado com as possibilidades, mas antes que pudesse perguntar algo para Carlos, uma voz chamou pelo seu nome. Era o prefeito lhe chamando.

Fernando entrou onde ficava o gabinete do prefeito.

-Estou aqui prefeito!- Disse Fernando enquanto fechava a porta.

-Você sabe que pode chamar só de Humberto. Como anda essas costas?- 

- Não foi dessa vez que acabam comigo chefe.-

Humberto cumprimentou Fernando com um aperto de mão. 

–Temos muitas coisas para resolver em pouco tempo. –

Enquanto o prefeito servia dois copos com um pouco de uísque, ele dizia:

-Como de costume, Carlos ligou o radio para ver se havia algo de novo na nossa região. Havia um sinal interferindo nossa comunicação com Três de Maio. Mexendo um pouco, Carlos conseguiu entrar em contato com esse sinal.-

Humberto tomou mais um gole de seu uísque. Colocando o copo na sua escrivaninha, continuou:

-Conseguimos contato com um pequeno regimento de cavalaria estacionado próximo a Carazinho. Estão sob ordens do Governo Provisório Rio-Grandense com sede em Piratini. Eles estão vindo para cá!-

-Isto é maravilhoso! Entendo agora toda essa animação... - Toda a agitação voltou em sua mente. O mundo parecia mais vivo do que nunca agora. -Se parte do exercito e do governo sobreviveram na região quem dirá no resto do Brasil e no mundo?-

Fernando e Humberto brindaram em silencio, enquanto Fernando tomava um gole, Humberto colocava sobre a mesa um velho mapa rodoviário do Rio Grande do Sul e marcou com dois alfinetes a cidade de Horizontina e Carazinho.

-Eles irão chegar entre uma ou duas semanas. O importante agora é a continuidade da nossa história, como povo e nação. Esses dez anos nos destruiu, mas das cinzas.... das cinzas.... um novo povo, ainda mais forte vai surgir.  

Enquanto apontava para a localização de Carazinho no mapa, o prefeito continuou. 

- O Governo está mapeando localidades e a população para melhor reconstruir e administrar o Estado.-

-Já comuniquei o seu pai para que ele organize o hotel pare recebermos nossos visitantes ilustres. Recomendo que você termine de organizar o seu escritório e os arquivos com os dados da cidade. -

Enquanto Fernando saia da sala do prefeito, todas as luzes da prefeitura ligaram. Palmas e gritos de felicidade se espalharam pelo local. Hoje era o começo de um novo dia para a cidade. Os velhos tempos voltaram de certa forma na mente de Fernando.

(Capítulo 5: Os Novos Velhos Tempos - Parte 1-)

Nenhum comentário:

Postar um comentário